Este é um assunto controverso e difícil. E, cabe aqui uma análise teológica sobre as práticas da Igreja quanto a este assunto, levando em conta primeiro e especialmente o que nos informam as Escrituras Sagradas, depois olhando para a história da Igreja, de modo a que possamos ver de que forma este assunto foi tratado no decorrer do tempo, de modo a que possamos avaliar com maior propriedade o que hoje é praticado, e com conhecimento de causa, possamos estabelecer o que deve ser feito quanto à esta importante questão.
Em vários locais das Escrituras Sagradas encontramos o ato de ungir. Não há como ignorá-lo. Mas, é importante notarmos que invariavelmente o ato de ungir, quando se referindo à área espiritual, sempre teve o objetivo de separar e consagrar.
Há também outros usos para a unção, os quais iremos analisar mais à frente em nosso estudo.
Um importante detalhe que pode ser observado nas Escrituras Sagradas é que em momento algum, nenhuma mulher foi ungida para uma tarefa na área espiritual. Não há nenhuma referência a mulheres sendo ungidas seja para o serviço sacerdotal ou para reinar.
Muitos objetos foram separados para serem utilizados no tabernáculo, e como o próprio tabernáculo, eram também ungidos de modo a consagrá-los ao Senhor. A ritualística da unção era usada para se separar e consagrar estes objetos ao uso no culto a Deus.
"E disto farás o azeite da santa unção, o perfume composto segundo a obra do perfumista: este será o azeite da santa unção. (26) E com ele ungirás a tenda da congregação, e a arca do testemunho, (27) E a mesa com todos os seus utensílios, e o candelabro com os seus utensílios, e o altar do incenso. (28) E o altar do holocausto com todos os seus utensílios, e a pia com a sua base. (29) Assim santificarás estas coisas, para que sejam santíssimas; tudo o que tocar nelas será santo." (Êxodo 30:25-29 ACF)
"Também cada dia prepararás um novilho por sacrifício pelo pecado para as expiações, e purificarás o altar, fazendo expiação sobre ele; e o ungirás para santificá-lo. (37) Sete dias farás expiação pelo altar, e o santificarás; e o altar será santíssimo; tudo o que tocar o altar será santo." (Êxodo 29:36-37 ACF)
O claro entendimento dos textos acima é que os objetos ungidos se tornavam santos, ou santificados, e também santificadores, pois, tudo o que neles tocasse se tornaria também santo.
Hoje temos vários objetos separados para uso específico, durante os cultos a Deus em nossas Igrejas, como púlpitos, mesas, cadeiras, genuflexórios, cálices para a ceia, etc., contudo, não os ungimos para torná-los santos, ou santificadores. Isto se deve à teologia do Novo Testamento, que afirma categoricamente que desde a vinda do Senhor Jesus Cristo, santos são aqueles que são salvos através da redenção pelo Seu sangue derramado na cruz, e pela Sua ressurreição dos mortos:
"Não sabeis vós que sois o templo de Deus e que o Espírito de Deus habita em vós? (17) Se alguém destruir o templo de Deus, Deus o destruirá; porque o templo de Deus, que sois vós, é santo." (I Coríntios 3:16-17 ACF)
"Ou não sabeis que o vosso corpo é o templo do Espírito Santo, que habita em vós, proveniente de Deus, e que não sois de vós mesmos? (20) Porque fostes comprados por bom preço; glorificai, pois, a Deus no vosso corpo, e no vosso espírito, os quais pertencem a Deus." (I Coríntios 6:19-20 ACF)
O Templo de adoração passou a ser o coração do salvo, não mais um local de tijolos e pedras. O véu do antigo Templo se rasgou no momento em que Jesus Cristo cumpriu sua missão na cruz:
"E eis que o véu do templo se rasgou em dois, de alto a baixo; e tremeu a terra, e fenderam-se as pedras;" (Mateus 27:51 ACF)
Neste momento se estabeleceu uma Nova Aliança: Através de Jesus Cristo passamos a ter acesso direto ao Pai, sem a necessidade de qualquer outra intermediação, sem a necessidade de qualquer sacrifício físico, sem a necessidade de quaisquer obras humanas:
"Porque por ele ambos temos acesso ao Pai em um mesmo Espírito. (19) Assim que já não sois estrangeiros, nem forasteiros, mas concidadãos dos santos, e da família de Deus; (20) Edificados sobre o fundamento dos apóstolos e dos profetas, de que Jesus Cristo é a principal pedra da esquina; (21) No qual todo o edifício, bem ajustado, cresce para templo santo no Senhor. (22) No qual também vós juntamente sois edificados para morada de Deus em Espírito." (Efésios 2:18-22 ACF)
Nenhuma carne é justificada pelas obras da lei. Não cabe, portanto, qualquer ação humana, como a unção de objetos de modo a nos tornarmos santos ou santificados:
"Sabendo que o homem não é justificado pelas obras da lei, mas pela fé em Jesus Cristo, temos também crido em Jesus Cristo, para sermos justificados pela fé em Cristo, e não pelas obras da lei; porquanto pelas obras da lei nenhuma carne será justificada." (Gálatas 2:16 ACF)
Partindo deste princípio, claramente estabelecido pelas Escrituras Sagradas, qualquer objeto que tenha sido feito "santo" através de um processo de unção, ou através de qualquer outro meio ou ação humana, passa a ser objeto de idolatria, e abominação ao Senhor, pois, vilipendia o sacrifício de Jesus Cristo. Sacrifício este feito, de uma vez por todas, na cruz. Ato completo e perfeito na Sua ressurreição, não restando qualquer outra obra a ser feita, não necessitando de qualquer ação adicional.
Deste modo, atribuir-se poder a qualquer objeto inanimado, a qualquer produto ou alimento, é ato de misticismo, sendo deliberado desrespeito para com a divindade do Senhor Jesus, ao qual foi dado todo o poder no céu e na terra:
"E, chegando-se Jesus, falou-lhes, dizendo: É-me dado todo o poder no céu e na terra." (Mateus 28:18 ACF)
Tudo o que desejamos ou precisamos, devemos levar diretamente a Deus, em oração:
"Não estejais inquietos por coisa alguma; antes as vossas petições sejam em tudo conhecidas diante de Deus pela oração e súplica, com ação de graças." (Filipenses 4:6 ACF)
Pedindo sempre em nome de Jesus Cristo, e nunca utilizando fetichismos ou superstições, nada de águas, ou óleos "santos" ou mágicos, ou pedras, ou madeiras, ou qualquer outra coisa criada. Nada deve ser colocado como meio de obtenção de graça, pois o nosso único meio de graça é o Senhor Jesus Cristo:
"Não me escolhestes vós a mim, mas eu vos escolhi a vós, e vos nomeei, para que vades e deis fruto, e o vosso fruto permaneça; a fim de que tudo quanto em meu nome pedirdes ao Pai ele vo-lo conceda." (João 15:16 ACF)
A unção de pessoas era feita, quando com propósitos espirituais, com o objetivo de separar-se esta pessoa para uma tarefa específica, seja enquanto rei, sacerdote ou profeta. É importante também notar que todas estas tarefas eram realizadas em conjunto com o objetivo de guiar o povo de Deus tanto espiritualmente quanto secularmente. Também é importante ver que estas tarefas foram todas assumidas por Jesus Cristo, o ungido de Deus. Assim, Cristo é Sacerdote, Profeta e Rei.
Já no Novo Testamento esta ação, a unção de pessoas, foi substituída pela imposição de mãos, a qual outorga autoridade para ministrar, educar e servir, como até hoje é feito na ordenação de pastores e diáconos. Há que se entender, entretanto, que este processo não tem exatamente a mesma significação da unção com óleo de outrora, não há qualquer santificação sendo conferida através deste ato, pois, a santificação ocorre no momento da conversão quando o salvo é selado pelo Espírito de Deus, e não há também qualquer transferência de poder, pois, todo o poder está nas mãos de Jesus Cristo (Mateus 28:18), mas, este ato indica com firmeza que aquele que está sendo ordenado, é reconhecido pela Igreja como tendo sido separado por Deus para esta obra.
Os reis eram ungidos como libertadores para o povo de Israel e para governar sobre o povo como seu pastor:
"Amanhã a estas horas te enviarei um homem da terra de Benjamim, o qual ungirás por capitão sobre o meu povo de Israel, e ele livrará o meu povo da mão dos filisteus; porque tenho olhado para o meu povo; porque o seu clamor chegou a mim." (I Samuel 9:16 ACF)
Deus instruiu Moisés a ungir sacerdotes, de modo a consagrá-los e reconhecê-los como pessoas separadas para servir a Deus através do sacerdócio. Os sacerdotes julgavam sobre as diferenças entre as pessoas do povo, faziam expiação, santificavam o povo perante Deus, ouviam confissões de pecados, faziam sacrifícios de ação de graças e supervisionava os trabalhos no tabernáculo, entre outras tarefas.
"E vestirás a Arão as vestes santas, e o ungirás, e o santificarás, para que me administre o sacerdócio. (14) Também farás chegar a seus filhos, e lhes vestirás as túnicas, (15) E os ungirás como ungiste a seu pai, para que me administrem o sacerdócio, e a sua unção lhes será por sacerdócio perpétuo nas suas gerações." (Êxodo 40:13-15 ACF)
O ofício profético era estabelecido pelo ato da unção:
"O espírito do Senhor DEUS está sobre mim; porque o SENHOR me ungiu, para pregar boas novas aos mansos; enviou-me a restaurar os contritos de coração, a proclamar liberdade aos cativos, e a abertura de prisão aos presos; (2) A apregoar o ano aceitável do SENHOR e o dia da vingança do nosso Deus; a consolar todos os tristes; (3) A ordenar acerca dos tristes de Sião que se lhes dê glória em vez de cinza, óleo de gozo em vez de tristeza, vestes de louvor em vez de espírito angustiado; a fim de que se chamem árvores de justiça, plantações do SENHOR, para que ele seja glorificado." (Isaías 61:1-3 ACF)
Não há uma descrição clara nas Sagradas Escrituras sobre como, ou qual, seria o ritual para a unção de profetas, mas, este fato está razoavelmente estabelecido através do texto de Isaías acima citado.
O azeite de oliva simboliza uma vida útil e vibrante, sendo símbolo de regozijo, saúde e de qualificações de uma pessoa para o serviço do Senhor:
"Porém tu exaltarás o meu poder, como o do boi selvagem. Serei ungido com óleo fresco." (Salmo 92:10 ACF)
Gordura misturada com perfumes especiais que lhe davam características muito desejáveis.
Era utilizado para ungir os pés dos hóspedes, simbolizando a alegria pela chegada daquele hóspede, e desejando-lhe boas vindas:
"E Maria era aquela que tinha ungido o Senhor com ungüento, e lhe tinha enxugado os pés com os seus cabelos, cujo irmão Lázaro estava enfermo." (João 11:2 ACF)
Também como era utilizado no cuidado pessoal com o corpo, pois, é um excelente hidratante:
"Naqueles dias eu, Daniel, estive triste por três semanas. (3) Alimento desejável não comi, nem carne nem vinho entraram na minha boca, nem me ungi com ungüento, até que se cumpriram as três semanas." (Daniel 10:2-3 ACF)
"Lava-te, pois, e unge-te, e veste os teus vestidos, e desce à eira; porém não te dês a conhecer ao homem, até que tenha acabado de comer e beber." (Rute 3:3 ACF)
O óleo tem poderes curativos, permitindo amolecer feridas e purificá-las. O óleo quando misturado a certas ervas, pode proporcionar medicamentos poderosos para vários males. Não é de surpreender que os médicos em Israel tivessem desde tempos antigos conhecimento destas ervas e da forma de utilizá-las no processo curativo de doentes.
"Desde a planta do pé até a cabeça não há nele coisa sã, senão feridas, e inchaços, e chagas podres não espremidas, nem ligadas, nem amolecidas com óleo." (Isaías 1:6 ACF)
"E, aproximando-se, atou-lhe as feridas, deitando-lhes azeite e vinho; e, pondo-o sobre a sua cavalgadura, levou-o para uma estalagem, e cuidou dele;" (Lucas 10:34 ACF)
Este ungüento era utilizado na preparação do corpo para o sepultamento, como parte de um processo de embalsamamento:
"Ora, derramando ela este ungüento sobre o meu corpo, fê-lo preparando-me para o meu sepultamento." (Mateus 26:12 ACF)
"E as mulheres, que tinham vindo com ele da Galiléia, seguiram também e viram o sepulcro, e como foi posto o seu corpo. (56) E, voltando elas, prepararam especiarias e ungüentos; e no sábado repousaram, conforme o mandamento." (Lucas 23:55-56 ACF)
O derramamento de óleo sobre a cabeça de um homem indicava que este homem havia sido separado para uma determinada tarefa a serviço do Senhor.
"Então tomou Samuel um vaso de azeite, e lho derramou sobre a cabeça, e beijou-o, e disse: Porventura não te ungiu o SENHOR por capitão sobre a sua herança?" (I Samuel 10:1 ACF)
"Preparas uma mesa perante mim na presença dos meus inimigos, unges a minha cabeça com óleo, o meu cálice transborda." (Salmo 23:5 ACF)
"Em todo o tempo sejam alvas as tuas roupas, e nunca falte o óleo sobre a tua cabeça." (Eclesiastes 9:8 ACF)
Também era usado sobre a cabeça com efeitos cosméticos:
"Em todo o tempo sejam alvas as tuas roupas, e nunca falte o óleo sobre a tua cabeça." (Eclesiastes 9:8 ACF)
A unção do óleo no rosto tinha como objetivo a hidratação, e a proteção contra as forças da natureza:
"E o vinho que alegra o coração do homem, e o azeite que faz reluzir o seu rosto, e o pão que fortalece o coração do homem." (Salmo 104:15 ACF)
Como já foi dito, este ato estava normalmente relacionado com uma recepção digna e alegre de um hóspede bem-vindo:
"E, estando por detrás, aos seus pés, chorando, começou a regar-lhe os pés com lágrimas, e enxugava-lhos com os cabelos da sua cabeça; e beijava-lhe os pés, e ungia-lhos com o ungüento." (Lucas 7:38 ACF)
Neste caso o óleo é utilizado como medicamento, sendo que através de suas propriedades curativas próprias, ou em combinação com ervas ou outros produtos era deitado sobre as feridas. Há muitos relatos deste tipo de procedimento na literatura talmúdica1, e alguns na própria Bíblia Sagrada, os quais já foram anteriormente citados.
"Volta, e dize a Ezequias, capitão do meu povo: Assim diz o SENHOR, o Deus de Davi, teu pai: Ouvi a tua oração, e vi as tuas lágrimas; eis que eu te sararei; ao terceiro dia subirás à casa do SENHOR. (6) E acrescentarei aos teus dias quinze anos, e das mãos do rei da Assíria te livrarei, a ti e a esta cidade; e ampararei esta cidade por amor de mim, e por amor de Davi, meu servo. (7) Disse mais Isaías: Tomai uma pasta de figos. E a tomaram, e a puseram sobre a chaga; e ele sarou." (II Reis 20:5-7 ACF)
Como vimos, fica, em nossos dias, descartado o uso da unção com óleo para objetos, de modo a torná-los sagrados ou santificados, já que nada mais pode ser considerado objeto sagrado, uma vez que o templo de Deus na Nova Aliança é o corpo daquele que teve seu coração transformado pelo sangue do Cordeiro de Deus.
Também não há mais qualquer necessidade de unção para sacerdotes, reis ou profetas. Ocorrendo no caso daqueles que se dispõem a servir como oficiais da Igreja, o ato da imposição de mãos, figura substituta da unção, mas, com significação distinta.
Resta então apenas um tipo de unção a ser analisado em termos de uso nos dias atuais: a unção de enfermos com fins medicamentosos. Não restou nenhum tipo de unção, com finalidades espirituais, a ser utilizada pelos crentes em Jesus Cristo após o estabelecimento da Nova Aliança.