Lâmpada para os meus pés é tua palavra, e luz para o meu caminho. (Salmo 119:105) Convenção Batista Brasileira
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Pr. Rubens Lopes

Um Pouco de Sol

A Canção Que Não Houve

Foi Gonçalves Dias que escreveu a "Canção do Exílio" - versos de rara sensibilidade - quando cantou as palmeiras da sua terra, que não lhe saíam da lembrança:

"Minha terra tem palmeiras
Onde canta o sabiá;
As aves que aqui gorjeiam
Não gorjeiam como lá."

O poeta pôde cantar no exílio, mas o povo de Deus, não. Era como se disséssemos: canção do exílio - a canção que não houve. Que não houve para Israel em Babilônia, terra do seu cativeiro:

"Junto aos rios da Babilônia, nos assentamos e choramos, lembrando-nos de Sião. Nos salgueiros que há no meio dela penduramos as nossas harpas, porquanto aqueles que nos levaram cativos nos pediam uma canção; e os que nos destruíram que nos alegrássemos, dizendo: cantai-nos um dos cânticos de Sião. Mas como cantaremos o cântico do Senhor em terra estranha?" (Salmos 137:1-4).

Um salmo possivelmente escrito por algum remanescente daquela odisséia - ali pelo ano 537 antes de nossa era - o autor é desconhecido. Já em Jerusalém ele fez uma triste evocação daquele drama que pungiu o coração de um povo. E que o escritor passou para a história molhando a pena não em tinta, mas, em lágrimas.

A descrição chega a ser patética: "nos salgueiros que há no meio dela penduramos as nossas harpas." Não podia ser mais viva e enternecedora a eloqüência do texto.

A Babilônia é uma terra de rios, como a Palestina é uma terra de montanhas. Regada pelo Tigre e pelo Eufrates, que se multiplicam em canais. Nas suas horas de lazer, que não seriam muitas, os israelitas procuravam os pontos mais pitorescos da região - os lugares ribeirinhos. Levavam as suas harpas para tangê-las na hora da saudade - havia todos os dias a hora da saudade. De reminiscências. A alma carregada de recordações. De nostalgia.

"Se eu me esquecer de ti, esqueça-se a minha alma de sua destreza" (Salmos 137:5).

Jerusalém. O templo em ruínas. O altar profanado. As ruas desertas. Os lares vazios. Os campos devastados. A população tangida como gado para o cativeiro.

Tudo isso - e eles haviam de cantar?

De cantar ou de chorar?

E eles choravam. Choravam todos. Choravam as harpas, baloiçando ao vento, silenciosas. Até os salgueiros, com suas folhas largas: salgueiro gosta de água. Cresce à beira de rios. De lagoas. E lágrima não é água, muita água, misturada com um pouco de cloreto de sódio e outro pouco de albumina e de alguns sais?

Então os pobres proscritos não tiveram coragem de cantar. Mesmo apertados pelos seus feitores que queriam rir à custa do sofrimento daqueles infelizes.

Pois deviam ter cantado. Deviam ter escrito aquela canção do exílio, como Gonçalves Dias escreveu a sua. Pensando não tanto no templo, que estava longe, mas em Deus que está sempre perto de quem o busca. Que não está apenas em Jerusalém, mas na Babilônia também. Que pode ser encontrado em palácios e em senzalas. Que é de livres e de escravos.

Com Deus o homem pode cantar mesmo no desterro.

Mas, choraram. Foi pena.